Veneno
"Eu bem quisera, quando chego a ver-te,
vendo este infame amor, poder negá-lo;
porém logo a razão justa me adverte
de que só há remédio em publicá-lo:
porque do grão delito de querer-te
só é pena bastante o confessá-lo”.
Juana Inés de la Cruz
Oh, minha senhora!
Teu último imeio chegou assim como uma flecha – certeira; reta; imponderável e absoluta. Trazia em sua ponta assassina não apenas veneno... trazia mais:
– "Meu querido, estamos num beco sem saída. E eu que pensei que eles não existissem!".
Penso senhora que não se deve (jamais!) encurralar um gato – ou qualquer outro animal –, num beco sem saída. Ele vai atacar, incontinente, quem quer que o faça. Instinto.
Oh, minha senhora! (Não consigo mais chamá-la de "meu amor".) A senhora foge, esconde-se, tem medo... (Eu compreendo. Compreendo?) Agindo assim, senhora, vais murchar. É inevitável. Vais murchar!
Dia desses, senhora, eu a vi. Minto, não cheguei a vê-la, cheguei apenas a pressenti-la. Me observavas de uma certa janela. Senti o calor dos teus olhos. Quando tentei buscar, com os meus, aquela fonte maravilhosa de emanação, a senhora os recolheu, rápida como uma ave de rapina. Mas quer saber? Aquele facho de luz colorido e quente ficou, por um breve tempo, denunciando teu ato.
Enquanto murchas, senhora, permita-me que te lembre: foi há pouco que aconteceu (pra mim, parece que foi agora), tão denso e suave; tão leve e limpo; tão forte e maleável, que chego a ter a grata sensação de poder tocá-lo. Sabe do que falo, senhora? Falo daquele momento (pra mim foi agora), lembras? Da noite em que nos beijamos como se não houvesse mais tempo pra nós, como se um de nós fosse morrer no momento seguinte, lembras?
Então...
Aquilo foi mágico, a senhora sabe, a senhora se lembra: a senhora virou menina outra vez, ali, naquele momento, em meus braços. Não se esquece um momento daqueles, pelo simples fato de ser singular, de fulgor radiante e majestoso!
Naquela noite, tinhas um compromisso de mulher casada, lembras? Chegastes ao local de forma radiante – era a menina que insistia em participar da festa! –, e tua beleza e felicidade foram denunciadas por uma amiga, gerando ciúme e desconfiança, lembras?
Então, senhora... Lembra-se? Então, por que preferes deixar que murche?
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